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Das noites silenciosas

Fui tua amante
Teu oposto
A metade inalienável
Do que nunca fostes
Do que nunca serás.
Fui tua amante
Debruçada no teu corpo
Por breves e raras noites
Noites de chuva
Noites de medo
Noites de açoite.
Amei e odiei o teu sexo
Mais odiei do que amei
Sou de gêmeos
E você, de touro
Destasorte, seguíamos as nossas vidas
Astrologicamente e sexualmente
Descompassados.
Não havia decreto,
Penitência
Ou corte marcial
Que me convencesse
Que o teu mundo seria o meu mundo
Que me convencesse de alguma verdade
Nas nossas fotografias
Que existia um quê
De identidade nas nossas fugas.
Sobrava-nos, destarte, o refúgio
Que, convenientemente,
Fomos um para o outro.

Fernando Martilis

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Contundência

O melhor de mim
Esteve a disposição dos mais singelos
E descompromissados abraços.
Expressivos abraços.
Pois, não preciso caber,
Não preciso ser verdade,
Não preciso ser modelo.
Não preciso ser a tua Monalisa,
Tu não conseguirias reproduzir o meu sorriso.
Não conseguirias rezar em mim,
Se me tomasse como a tua Capela Cistina.
Estive tua para além de qualquer pergunta,
De qualquer pressuposto,
Apenas estive.
Fui, para você, a maior das minhas verdades,
À disposição do teu olhar
E da tua fome.
Me coma,
Mas não me tomes!
Apreenda-me,
Aprenda-me,
Explore-me.
Me diga com as tuas palavras o que não sentes,
Ou o que sentes.
O que podes e o que não podes.
Se não fores tu, não sedes mais ninguém.
Não para mim!
Nem comigo!
Há muito tempo fui além disso,
Para não mais voltar.

Fernando Martilis